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Porque julgamos os outros

Ontem eu precisei prestar depoimento no tribunal e saí de lá com a certeza que jamais poderia ter feito um curso de direito. Passei a vida toda artomentada porque fiz vestibular para dois cursos diferentes e desisti de me matricular no curso de Direito. Aos 40 anos, descobri que não poderia ter sido uma boa advogada porque detesto julgar os outros. Não me entendam mal, eu também já acreditei que poderia julgar as pessoas, mas com o passar do tempo, o certo e o errado tornaram-se elementos confusos quando preciso avaliar a conduta dos outros. Eu não posso mais afirmar com certeza o que faria se estivesse nesta ou naquela situação. Ninguém sabe, só quando é em nossa pele é que sabemos como agir. Quando eu li o blog do Fabio Hernandez com uma postagem interessante sobre a inglesa doutora que trabalhou como prostituta para pagar os seus estudos, não pude deixar de pensar no juízo nosso de cada dia. Para quem não sabe, a inglesa Brooke Magnanti trabalhou como prostituta enquanto cursava o seu doutorado e escrevia um blog contando as suas aventuras secretas. Magnanti, de 34 anos, disse ao jornal britânico "The Sunday Times" que escrevia o diário em um blog na internet, sob o pseudônimo "Belle de Jour" (A bela da tarde), para arrecadar dinheiro e financiar seu doutorado. Era um blog que surpreendia por ser muito bem escrito e ela resolveu revelar a sua identidade porque um ex-namorado ameaçava divulgar a história. Ela se antecipou e escreveu dois livros e a sua história vai virar uma série de TV. A estrevistadora de um programa popular fez perguntas a Brooke do tipo "você se arrepende, por que fez isso", etc e tal e ela respondeu com a tranquilidade dos que estão em paz com as suas escolhas. Nós também condenamos e absolvemos os nossos colegas, vizinhos e parentes como se os outros também não nos julgassem. Sempre pensamos que teremos todas as respostas em todas as situações, mas a vida sempre nos pega peças. E aí, é bom estar preparado para encarar os olhares de reprovação dos vizinhos...

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As aparências sempre enganam

Já faz um tempinho que eu queria escrever sobre a foto que compara as roupas e o "estilo" de Suri Cruise (filha do Tom Cruise e da Katie Holmes) e Shiloh Pitt (filha de Brad Pitt e Angelina Jolie). O tom da manchete da revista me deixou chocada porque se trata de uma questão machista disfarçada de um olhar fashion. Com a história de aluna que foi humilhada por causa da saia curta, o assunto voltou a martelar na minha cabeça. Vamos por partes: porque a Suri é considerada a queridinha da moda e faz a festa dos fotógrafos? Porque escolhe as próprias roupas, como afirmou a mãe? Rá, eu tenho uma filha de quatro anos que também escolhe as roupas, mas o resultado é beeeem diferente. O pais estão querendo nos convencer de que a menina tem um dom de escolher marcas famosas e combinações fashionistas? Ninguém fica chocado quando vê uma menina de três anos usando saltos altos? Agora, o outro lado da moeda: porque as roupas despojadas de Shiloh causam tanto desgosto nos jornalistas? Porque até onde eu entendo, ela é uma criança, e crianças sempre vão optar por roupas confortáveis ou roupas que lembram uma fantasia de qualquer coisa. O pior é a insinuação de que uma é doce, frágil e meiga e a outra masculinizada e desleixada. Qual é a semelhança com a aluna agredida na Universidade? Bom, o recado está claro, vista-se do jeito que as pessoas esperam, sair do padrão é correr riscos. A moça errou ao usar o vestido curto? Sem dúvida, mas não por ter atraído a violência, mas sim por ter subestimado a cretinice dos seus colegas. Ela estava jogando com as cartas que nos orientam diariamente, seja através da reportagem enaltecendo a Suri Cruise ou na revista Nova com os seus decotes de arrasar ou cabelão para seduzir. Talvez ela não tenha compreendido o que o sistema insiste em nos dizer, mas vamos reconhecer que é tudo muito confuso. A velha história da dama na sala e puta na cama é de enojar, mas nada parece ter mudado desde então. Quando eu estava na Universidade (pública, diga-se de passagem) eu usava camisetas sem sutiã. A comissão de frente avantajada sempre chamava a atenção, até que um dia um professor renomado, doutor, apalpou os meus peitos no corredor! Sem cerimônia, sem clima, sem qualquer preâmbulo sexual. Obviamente que eu fiquei chocada com o gesto, mas mais chocada ainda eu fiquei quando contei para os colegas mais próximos. Uma delas disse que a culpa era minha por andar sem sutiã mostrando os peitos por aí. Reparem só, foi uma mulher que fez o comentário, e não os homens. E quer saber? Eu vesti a carapuça e nunca mais usei este tipo de roupa naquele espaço. Isso aconteceu há mais de vinte e cinco anos, e eu queria acreditar que a sociedade mudou para melhor.Afinal, temos a lei Maria da Penha e o debate sobre as questões de gênero vem progredindo bastante. Infelizmente, ao ler manchetes como essa e assistir ao vídeo da aluna sendo agredida, começo a pensar que estou muito enganada...

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